sexta-feira, 22 de abril de 2011

O dentista prático



Tão antiga quanto a dor de dente é a odontologia, registros históricos mostram que ela ja existe desde os tempos dos faraós, no antigo egito. Claro que naquela época não existiam faculdades e os profissionais eram obrigados a aprender o ofício na marra, de acordo com a necessidade de cada caso.

Muitos "pacientes" morriam ou tinham seqüelas gravíssimas provocadas por procedimentos mal feitos, porém, na hora da dor, qualquer coisa servia.

O aprendizado se fazia através de um "profissional especialista" da época, numa relação de ensino pessoal, na qual o "aluno" avançava de forma gradativa de observador para ajudante e finalmente operador.

 Os dentistas práticos nasciam da necessidade e da carência do povo no cuidado dos dentes, em vilas que depois se tornaram cidades ajudando na construção da odontologia moderna.


O nome venerado como símbolo do início da profissão é o de Greene Vardiman Black, que iniciou sua carreira como Dentista Prático e depois se especializou, desenvolvendo vários estudos na área.

Black, nasceu no condado de Scott, em 1836; foi um dos oito filhos de um granjeiro e entalhador, desde jovem, demonstrava aversão pelo estudo, e raramente freqüentava a escola. Aos 17 anos, o enviaram a Clautonm, onde seu irmão mais velho, Thomas exercia a medicina. Durante quatro anos, viveu com seu irmão, aprendendo tudo o que lhe foi possível. Aos 21 anos se mudou para Mount Sterling, associando-se ao dentista prático J. C. Speer, depois de ter descoberto que a odontologia melhor se ajustava às suas aptidões mecânicas, em comparação à medicina. Aprendeu pequenos trabalhos. Então transcorridos apenas quatro meses, foi para Winchester, onde abriu seu próprio consultório de dentista prático. Ali tornou-se amigo do relojoeiro e do armeiro, aprendendo com esses profissionais muitas das técnicas que mais tarde utilizaria para projetar e construir instrumentos para sua prática e pesquisa, ajudando a melhorar a odontologia e se tornando um símbolo nessa área.


Alguns livros na antigüidade foram direcionados para os práticos, como em 1530, quando surgiu a publicação do primeiro livro dedicado exclusivamente à odontologia; estava, além disso, escrito em alemão e não em latim, e era dirigido aos barbeiros e cirurgiões que tratavam a boca, e não aos médicos com educação universitária que ignoravam tudo sobre as enfermidades dos dentes. O autor do livro "Artzney Büchlein" provavelmente permanecerá para sempre no anonimato.


Na China, ao longo da maior parte de sua história, dentistas bem preparados com conhecimentos teóricos e pouca prática, atuavam como especialistas ambulantes e fixavam seus "consultórios" nas esquinas dos povoados e cidades, atraindo seus clientes tocando um tambor ou montando pequenos espetáculos.

A evolução da formação dos profissionais e da própria profissão no Brasil, assim como o início do ensino regulamentado, faz parte da História da Educação brasileira, já que nossas Faculdades de Odontologia foram regulamentadas depois de outras, pelo fato de sua colonização ser recente.

A Odontologia, como as demais ciências da área da saúde, percorreu muitas etapas no decorrer de sua trajetória, passando pelo Pré-Cientificismo nos séculos XVI e XVII, chegando ao surgimento de escolas especializadas na prática odontológica, iniciando, assim, a fase Científica. Apesar da fiscalização vigente em cada época, no Brasil, o exercício da Odontologia ficou por muito tempo nas mãos de escravos, negros e mulatos sem estudos e sem técnicas.


Século XVI

De acordo com historiadores, essa nova conquista ficou quase esquecida durante o reinado de Sua Majestade D. Manoel em Portugal. Dessa forma, somente no reinado de D. João III, surgiram os primeiros núcleos coloniais como por exemplo, São Vicente, o primeiro povoado brasileiro, fundado por Martim Affonso de Souza em 1530. Depois, em 1550, com Thomé de Souza, foram fundadas as cidades de Salvador e Rio de Janeiro. Embora houvessem poucos habitantes nesses núcleos, deveriam existir "mestres" de todos os ofícios que se necessitassem, entre eles mestres-cirurgiões e barbeiros, que curassem, sangrassem e tirassem dentes.

Barbeiro: Além de cortar, pentear os cabelos e barbear, fazia curativos em vários tipos de machucados e operações cirúrgicas pouco importantes. Por terem adquirido grande habilidade manual, passaram a atuar na boca, fazendo também extrações dentárias, porque muitos cirurgiões, por receio e desconhecimento não intervinham.


Sangrador: realizava sangrias (retirava o sangue), prática muito comum através de sanguessugas e ventosas. É bom saber que ventosa é um vaso cônico de vidro ou de metal que se aplica sobre a pele e no interior do qual se rarefaz o ar com estopa queimada ou por outros processos, afim de determinar uma violenta aspiração que produz uma revulsão na parte do corpo a que se aplica.

Século XVII

Até o século XVII, não havia na legislação portuguesa lei regularizando a prática da arte dentária. Somente licenças de alguns profissionais, que dependiam do cirurgião-mor, de acordo com a Carta Régia de 1448, de el-rei D. Affonso, de Portugal. Somente através da Carta Régia de 9 de novembro de 1629, foi elaborado e assinado por Pedro Sanches Farinha um regimento para o "officio de cirurgião mór", em 12 de dezembro de 1631: deveriam visitar e examinar, instituindo multa às pessoas que tirassem dentes sem licença, incluindo dessa forma os barbeiros e sangradores. Parece que sangrador e tiradentes, ofícios acumulados pelos barbeiros, eram coisas que se confundiam, podendo o sangrador também tirar dentes.


Século XVIII

Aparecem os primeiros vestígios de legislação no Brasil regularizando o exercício da arte de curar em todos os seus ramos, sendo ainda respeitadas as leis do antigo reino. É interessante salientar que, durante a fase Pré-Cientificista alguns historiadores destacam a Europa como o berço da prática Odontológica, surgindo naquela região os primeiros escritos sobre essa Ciência.

Nas últimas décadas desse século, surgiu como herói, agitando o cenário político nacional, Joaquim José da Silva Xavier (1746 - 1792), conhecido como Tiradentes, por exercer entre os seus múltiplos ofícios, o de dentista. Também conhecido como o Mártir da Inconfidência, nasceu na Fazenda do Pombal, entre São José (hoje Tiradentes) e São João del Rey - MG. Filho de Domingos da Silva Xavier e de D. Antonia da Encarnação Xavier. Ficou órfão de mãe aos 9 anos e de pai aos 11 anos, foi encaminhado para a casa do padrinho, o cirurgião Sebastião Ferreira Leitão, especialista em arrancar dentes e substituí-los por novos.

Ruínas da Fazendo do Pombal



Tem-se como certo que foi Sebastião quem ensinou ao afilhado a arte de tirar dentes, além de completar sua alfabetização. É citado que Tiradentes tinha grande habilidade como operador e que não se limitava somente a isso, como era comum à grande maioria dos práticos do seu tempo, também esculpia, provavelmente em marfim ou osso de canela de boi, coroas artificiais para repor os dentes ausentes. Sua fama era conhecida até no Rio de Janeiro. É considerado o "Patrono da Odontologia".

Século XIX

Na cidade da Bahia, em 06 de agosto de 1802, foi designado por D. João VI para servir de comissário da Real Junta do Proto-Medicato, o cirurgião José Antonio da Costa Ferreira. Ele inspecionava os profissionais cirurgiões, sangradores, algebristas, dentistas, emplastradores e outros, multando os que não tivessem legalmente aptos a exercer as atividades ou que curassem sem carta.

Na época não havia um diploma de médico, que permitisse exercer todos os ramos da Ciência. No princípio de 1808, fugindo de Lisboa, que estava sendo invadida pelas forças francesas, o príncipe regente D. João VI, sua corte e a nata da sociedade portuguesa (cerca de 15 mil pessoas) chegavam a Salvador, tornando-se o Brasil, por esta contingência, sede do reino, estabelecendo um grande surto de progresso. No hospital de São José, na Bahia, criava-se a Escola de Cirurgia, graças à interferência do Doutor José Correa Picanço, físico e cirurgião-mor, em nome da Real Junta do Proto-Medicato. Ele expediu cartas legalizando 11 barbeiros de Salvador, todos negros, de baixa classe social, forros e até alguns escravos de poderosos senhores.

Dr. José Correa Picanço
Na época, para moralizar a atividade ante às inúmeras queixas contra os profissionais, a carta de barbeiro citava que este não poderia tirar dentes sem ser examinado e não poderia sangrar sem ordem de médico ou cirurgião aprovado. Arrancar dentes era um direito incontestável do sangrador, cuja carta era análoga à de barbeiro.

As cartas eram semelhantes às expedidas aos barbeiros baianos. Assim como lá, barbeiros e sangradores eram  normalmente escravos ou forros, utilizando enferrujadas e infectadas "chaves de Garangeot", que extraíam os dentes dos escravos e dos brancos mais humildes, com técnicas desorientadas, causando traumatismos nos dentes, lábios, queixo, língua, tecidos da boca e com manobras intempestivas, tirando também dentes próximos aos que realmente haviam necessidade.

Extração  dentária
Instrumento utilizado, a chave de Garangeot





Uma carta de barbeiro
Do Século XIX, sabe-se da existência de uma gravura de Jean Baptiste Debret (1768-1848), francês que viveu no Brasil de 816 a 1831. Pintor, gravador e desenhista, retratou cenas do Brasil Colonial. Sua gravura, intitulada "Botique de Barbier", representa a fachada de uma casa humilde, tendo na parte superior uma grande placa com os dizeres: "Barbeiro, Cabeleireiro, Sangrador e Dentista" , indicativo das atividades exercidas por escravos neste local.


Em 07 de outubro de 1809 foi abolida a Real Junta do Proto-Medicato, ficando todas as responsabilidades ao encargo do físico-mor e do cirurgião-mor, com a colaboração de seus delegados e sub-delegados.

A primeira carta de licença expedida a um “dentista” foi no ano de 1811; expressava em seu conteúdo apenas o direito de “tirar dentes”, não fazendo alusão a qualquer outro serviço bucal. Pode-se considerar que esse era o único procedimento nas atividades do dentista, considerado danoso e causador de “incovenientes”. É razoável supor que os outros procedimentos odontológicos e ou protéticos, feitos também pelos dentistas e barbeiros, não se constituíam em ato privado de nenhum grupo, uma vez que não são sequer mencionados. Esses eram possivelmente praticados por quem demonstrasse maior habilidade e competência para restabelecer a função e estética de maneira, pelo menos, aceitável, em face das técnicas e materiais rudimentares da época. Dessa forma, o resultado do trabalho era julgado pelos próprios consumidores, baseados em seus critérios de estética e conforto, já que nada se pode dizer sobre o restabelecimento da função.



Os barbeiros carregavam, ainda, o desprestígio daqueles que lidavam com o sangue, exercendo atividades que tocavam e cortavam o corpo – consertar pernas quebradas, drenar pústulas, cuidar das doenças de pele, aplicar ventosas e sanguessugas, realizar sangrias, tirar dentes – caracterizadas pelo trabalho manual, o que, desde a Idade Média, era menosprezado, atraindo para si uma baixa estima social.

Da parte dos homens livres que aqui viviam, os ofícios de dentista e de sangrador não eram atrativos, exatamente pela sua baixa posição social, sendo melhor, na escala social, a opção pelo ofício de cirurgião.

Nessa primeira metade do século XIX, surge uma certa hierarquia social, com os barbeiros, sangradores e dentistas possuindo um status social mais baixo que o dos cirurgiões, e estes mais baixo do que farmacêuticos e médicos.

Farmcêuticos e Médicos, Sec. XIX
Essa hierarquia se perpetuou por todo o século XIX, acentuando a diferença entre cirurgiões e barbeiros, pela aproximação dos primeiros aos médicos. Os dentistas ainda mantiveram uma forte associação com os barbeiros até princípio do século XX, com sua imagem fortemente vinculada às atividades manuais, de baixa estima social, apesar das conquistas que foram incorporando, ao longo do tempo, à construção de uma identidade profissional.

A partir do século XX, vemos a Odontologia tomar forma, crescer, e ganhar credibilidade.

Hoje, século XXI, temos muita tecnologia, o mundo mudou, exigiu profissionais cada vez mais capacitados e equipamentos mais sofisticados. Uniu o conforto, o prático, o belo e o profissional em um só ambiente!

Como ja comentei em outro post, venho de uma família de dentistas, e gostaria de deixar registrado neste,  uma homenagem a meu bisavô Aristides Pinheiro e a meu avô Ramiro Pinheiro, dentistas práticos, dos melhores de seus tempos, pelo menos é o que ouço de seus pacientes. Essa homenagem não está restrita apenas a meus entes queridos, mas a todos aqueles que conhecem, já foram atendidos ou foram dentistas práticos!!!

2 comentários:

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